SOLIES, um breve relato...

Nos dias 13 e 14 de novembro a Universidade Federal de São Carlos sediou o encontro de dirigentes e docentes das áreas de informática de diversas instituições de ensino superior no Brasil, buscando discutir formas conjuntas de disseminação da cultura de software livre nestas instituições. Com apresentações sobre o estado de utilização de software livre na USP, UNICAMP, UNESP, UFMG, UFSCAR e UNIVATES e painéis reunindo os representes destas Universidades e a platéia de 75 pessoas, o evento terminou com uma proposta de ações conjuntas a serem iniciadas imediatamente, dentre elas um portal na internet que sirva para a
exposição de casos de sucesso que podem ser reproduzidos (tanto de aplicação didática como administrativa), repositório de softwares e central de discussões e treinamento. Este portal será implementado no CódigoLivre (http://codigolivre.org.br). Outras propostas incluem a discussão da base curricular, de forma a que a mesma não privilegie ferramentas de software proprietário e dê maior espaço à utilização do software livre na prática do ensino.

Provocando a audiência para o painel onde todos participariam, o Prof. Imre Simon apontou a experiência do distrito de Extremadura, na Espanha (que eu e as GNURIAS já tínhamos visto no Uruguay), de onde o Windows simplesmente foi banido. Falou também sobre a distribuição Knoppix, que permite a experiência bastante completa com software livre sem a necessidade de instalação de absolutamente nada - roda diretamente do CD. Como eu tinha uma cópia do FreeEduc, um Knoppix preparado para experiências didáticas com SL, ofereci-me para copiar um CD a quem estivesse interessado (queimei uns doze CDs). O professor Imre lembrou que o software livre é só um aspecto da necessidade de que todo o conhecimento seja livre, e propôs que ferramentas como o CódigoLivre
acomodassem também projetos de disseminação de conhecimento não necessariamente voltados à área de informática. Sobre a questão de incentivos para o software livre, disse que os mesmos não funcionariam se impusessem normas cartoriais, organizatórias ou hierarquizantes. Recomendou a todos a leitura do artigo de Benkler: Coase's Pinguin, or, Linux and the nature of the firm.

Algumas questões levantadas no debate aberto:

- Empresas de software proprietário veladamente incentivam a utilização de cópias ilegais em computadores pessoais, e doam cópias (ou as oferecem por preços baixos) às instituições de ensino, o que mantém uma pressão constante nas empresas para a utilização de seus produtos. Os fornecedores de software proprietário, então, promovem ações anti-pirataria para colher seu dinheiro nas empresas. A Universidade não pode atuar como ferramenta de pressão nas mãos dos fornecedores de software.

- Aos docentes deve ser dada a liberdade de escolha de ferramentas, mas uma escolha responsável aliada à política da instituição de ensino, e não conivente com pressões de mercado. Constata-se que hoje a liberdade de escolha de uma ferramenta por um docente significa a adoção de uma ferramenta única que já é de seu conhecimento anterior, e não do favorecimento à pluralidade de ferramentas (ainda que proprietárias).

- Sobre a questão de corresponder ao mercado, citou-se o exemplo de que não cabe à Universidade atender a demanda de anúncios que pedem por uma ferramenta específica. A Universidade não forma usuários de ferramentas
específicas, mas pessoas capazes de se adequar a múltiplas ferramentas ou mesmo de construí-las.

- A Universidade não deve privilegiar o espaço de docentes inflexíveis, capazes unicamente de trabalhar com as ferramentas com as quais já está acostumado, mas sim docentes com a mente aberta, capazes de desafiar a curiosidade dos alunos na busca constante e sem limite de novas informações.

- A Universidade deve se preocupar mais com a formação de cidadãos responsáveis e comprometidos com sua comunidade, antes de formar
empresários de sucesso (a ordem de prioridade em aspectos de formação deve ser sempre questionada).

- As IES devem ter regras de aquisição de ferramentas que primem por requisitos didáticos, e não por "features" com as quais um docente simpatiza.

No dia 14 o Rubens Queiroz falou sobre a comunidade de desenvolvimento de software livre, e a forma aparentemente anárquica sobre a qual se organiza. Citou exemplos de "auto-organização" em torno de ferramentas como o Rau-Tu e o Código-Livre.

A seguir, com base nas discussões do dia anterior, buscou-se sumarizar as ações propostas neste fórum, dentre elas:

1. Será criado no CódigoLivre um portal unificado sobre Software Livre nas instituições de ensino superior, mantido por uma equipe interinstitucional que buscará disponibilizar ferramentas, casos de sucesso e treinamento.

2. Será proposto a todas as Universidades Públicas que tornem os softwares produzidos por elas em software livre, sob a licença GPL. A proposta deverá se estender a qualquer software produzido através de dinheiro público.

3. Serão organizadas oficinas específicas para o desenvolvimento em Software Livre, sendo que a primeira ocorrerá na UNICAMP no início de 2003.

4. As Universidades trabalharão conjuntamente em uma política de aquisição de software que não privilegie softwares proprietários e abra mais espaço para o software livre.

5. Será iniciado um trabalho pelas várias instituições que participaram do evento, visando inicialmente uma avaliação dos currículos dos cursos para verificar se hoje eles privilegiam ferramentas proprietárias específicas de software, e será proposta a modificação destes currículos para que também dêem abertura ao software livre.

As propostas e discussões levantadas neste fórum serão publicadas na "Carta de São Carlos", a ser publicada no site http://www.ufscar.br/solies, e referendada por todas as instituições participantes.



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